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A mostrar mensagens de junho, 2013
Desces cansado pelo mar dentro, como quem se deixa afogar por não ter por onde nadar. De redondo, o mundo, enche-se de quadriculadas mentes. Que cegueira nos tolda a certeza de ter vida além do sol, das estrelas. Quantas pontilhadas luzes se ocultam no céu escuro, com medo de brilhar. Escondem entre si os olhares de quem se transformou em luz, vedam-nos a descoberta de sermos além, até que o descobramos no nosso derradeiro sopro de ar, no desprender brusco de quem nunca se soube eterno. Aguardarei por ti, Sol, no mar onde te afogas, para que me ensines a nadar nos meus passos inseguros pelos raios prateados que penso serem água.
Nunca conversamos a sério. Quando estou sentado no muro, aquele velho e descolorado pedaço composto por tijolos, alguns já partidos, com musgo verde escuro e seco, que o calor não perdoa, e te vejo passar tu nem olhas. Corres e nada te parece abrandar.  Quanto te vejo a descansar, num muro qualquer, por vezes até junto a mim, sou eu que corro e atropelo a vida, apenas para chegar a locais onde nunca quis estar.  Sei que fechas os olhos, também o faço.  Nestes momentos encontramo-nos a meia distância de nada, tu saudoso descansas no meu colo e eu, que te vi nascer, deixo-te correr nos sonhos para sentires que do princípio ao fim és eterno, mesmo sem o saberes.  As pessoas dizem-me "não tenho tempo" e eu sorrio, não o deveria fazer, afinal, os outros não te têm porque existes apenas aqui, fechado, na minha mão.  Nunca conversamos a sério. Tu sabes que não existo e eu... bem, eu sei que tu não tens amaras para te prender ao meu cais. Não é, tempo?
Céu sem nuvens. Sem elas, nunca sei de onde poderás estar a espreitar.
Voltei ao caminho onde os pés descansaram, não pelo cansaço, mas para lhes ensinar que debaixo deles descansa o solo que outros colheram e, por isso mesmo, que sejam eles sementes de melhores pessoas.
De tão intenso, sobe-me o céu que se põe atrás de uma nuvem, para se despedaçar ruidosamente à frente do meu sonho.
Chove. Adoro. O som. As calças encharcadas, pés molhados, o guarda-chuva ri-se. O cabelo, se existisse, estaria molhado, mas contente também. Dizem que não há mais estações, enganam-se, basta ouvir as pessoas queixarem-se para se saber que há invernos prolongados dentro de cada um.  O som ritmado da chuva a cair no chão, nas poças de água, a fazer-se mais água. Recorda-me tempos de simplicidade, de veracidade, de cumplicidade com a felicidade, em que chover era chuva e o Sol era descanso sobre uma sombra. Dos tempos em que escrevia mentalmente sobram apenas as ideias, os sonhos, que se vão encostando a mim e a escutar a chuva. Curioso, como o tempo, que me parece estar a encolher, se encarrega de fazer chegar a mim as estações de um dia só.
Querida noite, que me invades, hoje a Lua ergueu-se sem que chegasses. Bem vinda à rebelião.
E sorriu, por cima da tristeza e das manhãs que se molham mesmo sem orvalhar. Os anos medem-se pelos cigarros que treparam pelos dedos, o arfar ritmado é já batimento de um coração que de tão grande vive fora de si. Não haverá enxada ou ancinho que lhe conheça os calos de cor, nem um sol a pico que lhe veja a sombra. O homem é cajado de si mesmo e busca lá no fundo pelo gargalo, em forma de goteira, o rio que o há-de levar a ribombar pelas margens até chegar ao fim da foz e perceber que o mar é toda a gotícula que nasceu do céu, apenas para orvalhar.
Olá tempo. Vamo-nos encontrando às escondidas, quando metes por baixo da porta um panfleto com os meus sonhos e, sobressaltado pelo alarido do papel a deslizar sob o ar e sobre o mundo, abro a porta já só para te ver de costas, a descer os degraus para um local que não conheço.
Vou deixar que as ondas te levem, chegarás onde que quer que a maré pare para descansar. Se da espuma te despires, pensa na areia que sente a tua falta, leva-a contigo, nos pés, sente-a querer ser parte de ti, pois também, pedaço de mundo, fazes parte desde minúsculo mundo que, de tão raro, tão precioso te vê a caminhar, entre ondas, que te levam. O mundo assemelha-se à perfeição. Guarda uma passagem para um infinito que se esconde na linha curva formada pelo encontro do mar com as nuvens que vi nascer nos teus olhos.  As ondas não te levaram. Também não te trouxeram. Continuo a cravar os pés na areia, a água recua e eu sinto-me vacilar, não me vá o mundo fugir, mas é apenas a ilusão, dos olhos, afinal temo-os para os iludirmos, porque as marés mais retemperadoras vêm-se de olhos fechados.
Agradeço-te nudez pela ausência do que não me cobre, ofereço-te respostas mudas com um despido dia ao  - "que tens tu?" - "não tenho nada, sou pobre" e ainda que soçobrado não claudico - "visto-me com este corpo, nu" Poderia ser eu mais rico?
O tempo ameaça arrefecer e eu agradeço. Tenho comigo Garrincha, que sai à rua quando neva, de tão impaciente, ainda que pacato, transforma-me os dias em granizo, saraiva-me a sua vontade de vaguear por montes, um esmolegrino que pernoita em qualquer recanto, desde que quente, desde que local porque, disse-me ele, há poisos imensos que são nenhures e, confessa-me, o seu verdadeiro poiso (soube-o Torga quando o conheceu em vésperas de Natal) era debaixo do seu casaco, entre a pele e a Lua.
Cabem, entre duas mãos, infinidades de orações, não pelas caladas cantilenas e pregões, mas por cada aceno que uma alma dá em forma de adeus entre universos que o mundo teima dizer: não há, mas não sabe ele, mundo, que os universos que falo são meus?
Vê os dias, correm-se sem que tu te levantes, porque hás-de ser mais que as tuas feridas?