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A mostrar mensagens de abril, 2016

Os reternizados

Crónica de domingo na Bird Magazine. Olá filho, Escrevo um dia antes para te poder dizer isto: Parabéns! A tua mão dorme aqui, a meu lado, embrulhada como sempre numa almofada, está tão enroscada que pergunto se não existirá na sua codificação genética algum tipo de ascendência genética com o bicho-de-conta. Gosto de te ouvir gargalhar com estas pequenas idiotices minhas. Ela já não deve estranhar o barulho dos dedos no teclado e nem a luz fraca do candeeiro a deve acordar. Acredito que depois do dia de hoje, quando o Sol saiu da toca pela primeira vez em vários dias, nem o gotejar das estrelas no zinco barrento do telhado a faria abrir os olhos. Escrevo como se não soubesses disto. Claro que sabes. Se calhar até foste tu que encomendaste um dia solarengo, com nuvens coloridas e sarapintadas de formas que apenas a imaginação infantil pode moldar. Paro um pouco antes de retomar a escrita, este meu hábito de escrever apenas no ar, sem grafar, faz com que me perca várias veze

Completo. Todos um

in Bird Magazine De real o Sol, o Ar, o espaço onde volito, a cara nua de quem se sabe ninguém, as linhas escancaradas às portas das palavras que choveram.  Um mundo, além do meu, do teu, onde o Sol é da cor da chuva e a neve cai de cada vez que sorris, um local feito de abraços e de silêncios, porque ninguém ousa falar palavras que não conhece, nem ninguém conhece o real, do Sol, do Ar, do espaço onde volito. Que faço eu ao tempo?  Que me faz o tempo, enquanto me percorre de alto a baixo, zombando dos dias que ainda não vivi? Sempre tive na noite minha companheira e confidente. Pessoa amiga das horas mais soturnas, dos meus momentos de solitude. À noite não sou boa companhia, levo comigo amizade e amor, no entanto, pouco falo, à noite não sou boa companhia. Teve-me frio e medo, esperança e ilusão, amparo e sonho, choro e riso. Teve-me sempre, sem reservas ou barreiras, no meio do nevoeiro, sob chuva intensa, iluminado pelas estrelas (que em Trás-os-Montes são mais estrelas), t
Vou pintando nos olhos as nuvens lestas somem-se no vento abrigadas pelas colinas esbranquiçadas arrefecidas num lento lamento, venta. Eu sou folha e caruma de mim o fruto que me cai aos pés sem recordação da sombra ou da areia dourada escavada ao redor da onda sob a espuma. Oscilo a caneta, não há destino se não se tem meta, ouço as vozes e escondo-me por detrás do que não sei ser, de mim a mim a distância de um retorno no olhar pousado no que não sei ver, mas as palavras que me sabiam salvar são as que me escrevem escondidas de mim porque não as sei falar.

Os mesmos caminhos percorridos com outros olhos

Crónica de domingo na Bird Magazine . Percorri esta noite, a pé, o meu velho caminho até à escola primária. Noite, Lua igual a tantas outras vezes, mas agora vista com outros olhos, um céu estrelado com algumas pinceladas de nuvens aqui e ali.  Meti pés à estrada. O caminho até à estação continua igual ao percorrido e ficará para outras situações. Cheguei à escola primária.  Perdeu o tamanho que possuía e a imponência que despertava em mim espanto e temor, mas continua mágica. Não preciso fechar os olhos para me ver correr pelo recreio, era um puto, pequeno, com sonhos, com piscar de olhos a imitar um pirilampo dos carros dos bombeiros. Os muros são agora mais baixos, as próprias paredes são menos brancas, baixas, do tamanho normal das casas.  Os degraus, que subia ofegante, são pequenas elevações.  O muro que separava a "escola de cima" da "escola de baixo" e que eu saltava com cuidado é do meu tamanho, do meu tamanho...  Tudo parece agora do meu taman

Personas agem

Crónica de domingo, na Bird Magazine em 03/04/2016. Há que introduzir vivacidade às personagens que vivem, nascidas agora, adultas outrora e, também, renascidas porque de serenismo bastaram no ocaso a que, silêncio involuntário, foram adormecidas. Estas são algumas das que me vivem atrás do que vivo.  “ Personas agem ” O vento crepita na lareira com a força musculada de quem, de machado ao ombro, chora no desconsolo decidido entre o amor ao que vive e a necessidade de viver, cortando a madeira, golpeando entre murmuradas desculpas o tronco do que cairá e, posteriormente, arrastado por entre vegetação, seguirá caminho até que as garras metálicas de um guindaste articulado à força de comprimido ar o agarrem virilmente e o coloquem sem pudor ou respeito no costado de um camião. Ele seguirá, machadado também no íntimo de si, pelo caminho contrário, rompendo a vegetação agrilhoado à vida, porque de viver se mata e segue pensando apenas que o vento trará o consolo de umas nuvens prenhe