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A mostrar mensagens de outubro, 2015
Preteritamente vagueio destino vai a quem se presenteia sei-o entre o volátil e a teia na caligrafia noctívaga em que amanheces pelas rugas que o cansado dia cultiva na tua face a vida não se ganha nasce. Conjuntivo-me às página abertas calculo-me à subtracção papírica o lápis adormece-me de pálpebras abertas arqueando a esfera celeste desdoura-se e escreve a negro sobre o carvão a esperança que tatuo no invisível que me leva pela mão.
Empobrecem-se as palavras na venda das letras, salpicam-se húmidas de encontro ao vidro redoma os dias comprados por metade, dou por mim fruto em árvore que arde. Deito-me sobre mim o peso da noite ansiosa, dia nasce!, suplica vem lá, já, ditosa a nascente da grafite desinteressada queda de sonoros gotejares colho-as maduras puras, o íntimo e o vago o espelho à sétima reflecte antes que mercantil a vaidade impere arrumo no bolso o abraço, aí vem um que fere.
Aconchego-me, ao peito a noite que adormece nas paredes sombras luzidias em estrelas caídas, tenho-me prece quem se cura das feridas? De mim a eu distância a quem nunca cresceu repousam os olhos, cansados, na infância onde perderam todos os pecados. Do que uso só me cabe a cama na divisão o meu lar habita oportuno encolhido no meu coração.
No agrilhoamento dos sentidos cansam-se as manhãs por acordarem gentios, claudicam as clareiras despertas esta vida não se faz de almas abertas, inocente o povo sai à rua cozinhado até ficar cru e ri-se, vestido do que é, coitado, vai nu.

Muda dança

Crónica de domingo na Bird Magazine . Não existem, pelo menos palpáveis, necessidade súbitas de poupança energética que nos façam valsar um passo atrás no tiquetaqueado tempo que vamos pivotiando na ponta dos dedos. O tempo, essa invenção dimensional, vai-nos presenteando com a ilusória crepusculosidade de dias que se parece amontoar no vago espaço entre as orelhas humanas. Ainda ontem trajava a mochila às costas e, já hoje, ou, na exactidão do relato, amanhã, terei como companhia na travessia até casa os fugazes pirilampos alados que se movimentam no zénite na rapidez de milhões de anos luz que medeiam os milímetros que separam o agora e o daqui a pouco. O relógio atrasa-se, ou atrasamo-lo, mas acredito que ele poderia atrasar-se até infinitamente parar no momento exacto em que o tempo, acompanhado pelo eterno, descansaria cansado nos braços de um criador que o apraz fazer-se sentir criado, não na subserviência, mas no acto de ter sido criado no propósito que apenas um criado

Voltar ao que serei

in Bir d Magazine . Volto ao que sou, deitado, com a luz do candeeiro como Sol, cabeça apoiada na almofada, revivendo alguma história à medida que as letras secam no papel. Tentei, já duas vezes em dias consecutivos, escrever no computador, mas não consegui. Preguiça? Talvez sim, talvez não. Aqui, neste meu novo caderno, estou mais perto do que pretendo, faltam apenas a chuva lá fora, as paredes de xisto, granito ou madeira, a luz trémula de uma vela, o telhado em madeiro ou colmo, as brasas a adormecerem na lareira apagada e uma manta de retalhos sobre mim. Esta semana tive a oportunidade de andar pela Serra do Caramulo em trabalho, perdido em locais acessíveis apenas por veículos todo o terreno. Enquanto percorri, abaixado, as minas de água, pensava se seria capaz de morar por lá, onde o silêncio é o único som que se ouve. Passei por casas que, de casas ostentam apenas o nome, parecendo esquecidas do próprio tempo. De repente, uma senhora, não muito idosa, sai de casa com o cão atr
Não há necessariamente um início corpuscular, bastaria o vento e o sol tímido por entre as nuvens, para saber que o mundo foi feito para ser terminado em pormenores que se remetem ao olhar silencioso por entre as folhas de tília e o saborear morno e terno de uma bebida fumegante à janela de um abrigo a que chamo casa.  Por lá estar, mesmo sem estar, remeto-me sem destinatário na esperança que a volta do correio me deixe a orbitar a certeza de a cada passo poder saltar sobre as esverdeadas pedras soltas do riacho. Procuro. Nem sempre me acho.
Meço a noite antes de me deitar. É mais curta que o sonho. Mas respeita. Pouco vale o vale a quem ora, de hora em hora, se não sabe que o sonho nasce do mar e não do cetim onde se gabam deitar. (fragmento IV de crónica na Bird Magazine, 16/07/2017)

A teu lado, sozinho

Crónica de domingo na BirdMagazine . “ I” Houve noites em que a cama dormiu fria e sozinha, tiritando na ausência da corpuscularidade masculina nos serões em que o suor molhava o cansaço e, assim, na ilusão da refresquidão, entrava-se noite dentro, entre o frio que as estrelas transpiram e o calor das fornalhas. Há que manter pão na mesa dos outros. E na nossa. Para conforto bastaria saber que no quente da manta que separa a noite do corpo dos filhos, todos dormiam a justiça de um trabalho são, mulher, filhos e a sua consciência. Noutros casulos, uma cozinha velha, preta, onde o vento uiva porque o telhado não assenta correctamente nas paredes, um forno velho tapado com panfletos de promoções de um antro-mercado qualquer, a pedra onde se fazia a lareira, as telhas de vidro para entrar o Sol, um rosto velho, onde o tempo gastou o olhar, umas velas retorcidas, um corpo num banco envolto em neblina invisível, uns sorrisos ténues e uns parabéns merecidos cantados pelos vizinhos próximos na

Animal esco

Crónica de domingo na BirdMagazine . Continuo a nutrir a mesma simpatia pelos cães vadios, altivos, do que quando tinha tempo para os apreciar. Há qualquer coisa de mágico naquele olhar alheio da nossa vida, tão cheio de vida. Vejo-os algumas vezes percorrendo as estradas molhadas, com aquela chuva fininha, que os faz franzir os olhos enquanto correm. Aliás, eles nunca correm, andam num passo apressado e tenho a certeza que é apenas para não apanharem da mesma chuva no mesmo local. Gosto de os ver parados, debaixo de um arbusto qualquer, de uma varanda de uma casa abandonada sem lá entrarem. Cães assim não são cães do alheio, são cães deles mesmos, quando encontram um local para dormir, sem ser em propriedade alheia, não dão mil e uma voltas no ninho, não, param, farejam e deitam-se, dormem enrolados, com o focinho encostado às patas de trás, abrindo por momentos os olhos para ver um ou outro vulto e lá se perdem, em sonhos de cão. Quem é cão assim não sonha. Quem saboreia a chuva como
Na manhã em que madrugo descubro,  ensonado,  sou sujeito  a caminhar sem predicado,  nem recado,  na obliquidade paralela  entre o meu olhar o horizonte, concorro,  comigo, quem de mim chega primeiro à fonte,  quase  sem voz,  encontrar-me, nascente.  E foz.