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A mostrar mensagens de dezembro, 2015

Ali anças

Crónica de domingo na Bird Magazine . Entro na sala. Ao olhar destreinado tudo parece normal, sorrisos e acenos, beijos em faces frias com odores femininos, palmadas másculas nas costas e o tradicional eco de “o que se quer é saúde”. O silêncio está ali, encostado a um canto da sala, pouco acima da minha cabeça, olha assustado para o som que se solta das pernas das cadeiras quando estas são arrastadas pelo chão e movimenta-se rapidamente desviando-se do ruído que é, por vezes, lançado quando ele parece já acostumado e adormecido. Bate célere a música, sons que são a sanidade da saudade. Uma vez, não muito longe, a lua riu-se de mim porque a confundi com um sonho distante o suficiente para se alcançar apenas em bicos de pés! Bate célere, repito, a música e eu, descompassado, valso por um salão vazio, entre trastos gastos por dedos que tocaram música e, acredito, também o céu. Há um sentimento de urgência, de urgente, de emergente, de gente, gente que procura e eu encontro, aqui, no si

Pré sépio

Crónica de domingo na Bird Magazine. Os dias acumulam nuvens cinzentas e a noite espreguiça-se bem mais cedo pelo céu adentro como dona e senhora de um tempo onde moram as lareiras acesas O vento atiça pinhais, a caruma comprime-se sob os pés, folhas resilientes de eucaliptos resistentes aproveitam a boleia do ar esvoaçante para o seu baptismo de voo. Um muro baixo de um tijolo fino parece abanar quando as duas mãos de puto içam o corpo e os joelhos primeiro e as biqueiras das botas depois embatem nele, até conseguir alçar uma perna primeiro, outra perna depois, e cair com estrondo no amontoado de caruma, mato, cascas de batata e restos de comida que as raposas, ouriços-cacheiros e outra bicharada do monte não comeram. A terra exibe peladas graníticas em todos os locais não cobertos pelo húmus e aspirantes a húmus e os locais menos percorridos, onde a erva, verde após as chuvas, menos calcada exibe um padrão de virgindade atrativo a quem busca o mesmo nesta altura do ano. A des

Poro do Sol

Crónica de domingo na Bird Magazine . Vejo o por do Sol várias vezes por dia, quando vou de carro e ele se esconde atrás de um monte ou de um amontoado de edifícios, mas nada se assemelha a quando caminho num local qualquer, preferencialmente um pouco a subir e, se puder escolher, que tenha terra e cascalho, para eu sentir as pedras comprimirem-se e esmagarem cascalhando-se umas nas outras, num sussurro que comparo ao bater do meu coração, vulgo músculo que por vezes esqueço possuir. O caminho ligeiramente inclinado, a minha perna com dificuldade em esticar refugia-se da dor, fazendo-me mancar e, até aqui, este balancear me faz sentir, por breves momentos, como que embalado pela temperatura amena, estranhamente amena para esta época do ano. A recta longa, para quem se desloca a pé, convida-me a alinhar o caminhar com o caminho, fecho os olhos, o Sol bate-me na cara, aperto o casaco e coloco as mãos nos bolsos. Por momentos, caminho como se ascendesse a algum tipo de estágio