Mensagens

A mostrar mensagens de março, 2023

Dia de um Pai

Imagem
“Dia de um Pai” ou um dia do Pai diferente, numa Crónica do Nada, no Correio do Porto. [poderá ler aqui ] A tarde de sábado, com um vento frio, traz consigo a última saída de casa de um octogenário jovial, sorriso fácil, tracto doce. A aldeia, apesar de vila, habita-se ainda dos idosos que resistem, enraizados, ao soluçar da passagem do tempo, testemunhas que são de um progresso que trouxe comodidade ao corpo, mas vazio às pessoas. Somos todos o classificado algoritmado potencial cliente de algo. Quem nada compra, nada vale. E quem nada vale não tem valor. Há quem lhe chame solidão. Há quem lhe saboreie a dor. O sobretudo negro pesa-lhe tanto nos ombros como as translações completas a um astro que o Homem habituou a respeitar. Cumprimenta-me com um acenar de cabeça. O sorriso quente que me aquece, debaixo do toldo do café, abrigado de mim mesmo. Dirige-se à montra do minimercado, por entre cartazes de festividades com horários para visitas filarmónicas e dos recentes “procuram-se traba

Sozinha

Imagem
“Sozinha”, mais uma contribuição no Correio do Porto, na minha secção " Crónicas do Nada "   – Ela está sozinha.   Foi a primeira frase da matriarca, ainda antes do proverbial bom dia, com que me deparei na sorumbática manhã de sábado, talhada pelos latires ansiosos do canídeo. O gato, senhor de si mesmo, chegou, viu e venceu, marcando o território, neste caso o celofane transparente que plastifica a protecção singela da ilharga do roupeiro. O cão, senhor de outros, fareja, segue-lhe os passos e as secreções, urinando com mais veemência. Ausculto o diálogo monologado da senhora, sexagenária tardia e mãe da cliente, onde a labuta universal de uma vida voltada à adversidade com um sorriso valia o epíteto de profissão. Aqui há os sardinheiros, os pedreiros, os charés, os presuntos e outros que esqueço agora, na sombria tarde de domingo, onde o ecrã do computador aquece o leito sobre mim mesmo, na camisola de lã cingida ao que me prende à vida (a qual me orgulho saber não existir