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A mostrar mensagens de março, 2012
Vou embrenhar-me em Miguel Torga, correr montes acima até encontrar uma fraga a jeito, ainda quente pelo Sol, e adormecer apenas com as estrelas acima de mim.
Já eu tinha atiçado o lume à torga longe vinha ainda o fumo  espesso de um ontem que se vive agora, adormeço sem que se cale ainda o resto de um dia à rebeldia do rumo que canta o relógio de hora em hora. Descanso palavras e ventos, deitado deixo o sono imperar enquanto os olhos se habituam à lúgubre luminosidade dos corpos marejados que teimam em cegar, a vida não tem idade nem se agrega em momentos, é colhida verde sem esbracejar altos voos, una e indefesa pela candura que nada pede. Dou-te meus sonhos que partem outros montes e moutados, do agreste que se faz tojo até bolota se faz castanha. Dorme, a vida é o esplendor desta vitória, que se conquista, nunca se ganha...
‎"(...) E a vida, a de todos os dias e de toda a gente, com lágrimas e alegrias, ambições e desalentos, ficara-lhe sempre ao lado, vestida de uma realidade que não conseguia ver. A aldeia formigava de questões e de raivas, e ele coava-lhe apenas a agitação de longe, vendo-a fumegar na distância, ao anoitecer, e acariciando-a então num cansaço doce e contemplativo. (...)" Eu e Torga.
De repente, de válido apenas os planaltos, sentado, frio, num muro a ver um rio, correr, comigo.
Era capaz de saltar de uma assentada de continente em continente, talvez aproveitasse a boleia de uma asquerosa gaivota, para poder galgar o mundo como se escrevesse uma flor, pétala em pétala, sem saber que é da terra o vidro por onde vejo a cascata de horas que escorrem pelas falésias de uma vida.
Renasceria nesta bolha de terra e água novamente, apenas para sentir o ar frio que se bebe à noite, ou o sorriso sincero e cúmplice de uma criança. Que fosse apenas por uma cevada quente ou pela borra que fica no fundo da caneca, misturada com as migalhas que se afogaram no negro do calor. Que fosse apenas pela amizade ou pelas palavras. Pela experiência de procurar no vazio todos os nadas que desconstroem a realidade. E voltar a casa, feliz, sistólica e diastolicamente completo, rumo a mais um universo, até, por fim, encontrar todos os outros eus que deambularam, sem destino deduzo eu, por multiversos e hexoversos.
As nuvens vão descendo. Ou descem. Não se preocupam com formas ou tempos verbais. Nem ais. Descem. E eu sei que a chuva vem aí. "Em Abril é que vai ser!". As pessoas (et moi aussi) não farejam o ar, bebem em doses industriais a verborreia que a televisão vomita e sentem-se saciadas. Está comprovado cientificamente. As pessoas, existem. Embora não comprovado cientificamente, a estupidez, também existe. "Ouviste falar da ..., já viste?". E a pessoa não viu (e o pintinho piú), mas concorda, "era atirar com eles todos para ...", e tecem-se comentários, atira-se lixo ao ar, como se a atmosfera fosse um grande (des)aterro. As más ideias não se cheiram, mas entranham-se, comprimem a luz natural, nossa, e a artificial, do Sol, que chega sempre atrasada aos dias. Talvez isto seja a explicação. Para o quê não sei, mas terá significado. As nuvens vão descendo, sei-o, farejo-as, com a vontade de meter pés ao caminho e galgar mundo, monte, sem deixar pegadas no solo, ...
Mentalmente, estive todo o dia sentado debaixo de um sobreiro, com uma merenda que abri sobre a erva, apenas a sentir-me vivo.
O ondular de uma chama, a brevidade de uma onda, a calma de uma noite e a secularidade de uma era.  O tempo urge.  Cinge-se.  Contorciona-se enquanto, lentamente, outro tempo emerge numa noite calma, numa onda breve, numa chama que ondula, no mar de quem se deixa levar pelo olhar.
A simplicidade é a mãe de todas as mentes em paz.
Aguardo que a luz das estrelas, palidamente, conquiste o seu espaço na noite e derrame, ainda que silenciosamente, todo o silêncio que me faz acordar.
Sulcaria a vida esgrafiando-a pudesse eu e tu as mãos tantas na paisagem espreguiçando-se ao vazio neste dia temperado a cru. De onde pendem os sorrisos e o egoísmo em mapas abraçados aos abrigos (is it there?) Cada noite um encanto ao postigo aguardo o sonho embora de pé guarnecido nunca me levanto. Falta-me eu e o tempo, os amigos que se amizandam o revolto olhar fechado ao vento a candura de uma manhã corajosa que almeja o dia, (ah, jeitosa!) sem saber que na equação da sua tabuada o produto do nada era tudo o que existia.