Quem é o sonhador?
Crónica de domingo na Bird Magazine . É de uma forma desformada que a noite me vai entrando pelo corpo. Começa pela sombra que contorna a caneta, depois pesa-me no olhar, desfoca-me a visão, aconchega-me com o pijama e um velho casaco azul gigante, a cor, não o casaco e, por fim, traz às costas um saco de pano do tamanho, vejamos, de um saco de pão normal, o saco, o pão também, e, lá dentro, todos os sonhos que vai mostrando. Por vezes comporta-se como um vendedor, africano, abre o saco, olha em redor, estou sozinho, estende os sonhos no chão, faz um movimento de arco-íris, que é como quem diz meia-lua, não importa a fase agora, como que exibindo o que tem, depois olha para mim e é isto que jamais esqueço, o olhar da noite nos meus olhos, e parece questionar: Qual queres agora? E eu, recolector por natureza, fico com todos tendo como fiel depositário ela mesma, a noite. Hoje guardou o saco, não me mostrou sonhos e, por momentos, vi sair dali um qualquer diabrete, agarran...