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A mostrar mensagens de outubro, 2023

São Simão

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“São Simão”, crónica do Nada, no Correio do Porto ( aqui ). Com o Domingo a transpirar em bátegas de água, resta-me navegar pelos riachos enfurecidos que escoam ao fundo da estrada, depois dos paralelos, até se aninharem nas verdes encostas de campos abandonados. Dizem que chove, consulta-se oráculos digitais cujos algoritmos, cada vez mais acertam menos, tais as vicissitudes climáticas que, tal como o Homem, estão cada vez mais estranhos. No meu resguardo à prova de água, sob o guarda-chuva inclinado ao vento, talvez em reverência a Eos, vou caminhando sem astrolábio ou balestilha. Há estrelas, mas não as vejo agora, pois a minha noite ainda não caiu e o firmamento, para já, é este tecido cinzento que se encima sobre as varetas. A placidez de um São Simão chuvoso, entre falos exagerados com laços azuis e cor-de-rosa, pendurados nos toldos impermeáveis das doceiras, e autocarros estacionados entre regatos, vai contrastando com as canecas de vinho novo, tintadas pela inconstância de mão...
O vento queimado ondula as cinzas no olhar de quem não se vê, a fuligem é tudo o que resta. O respirado matinal enrubescido humilha o solitário tição exaltado, a vaidade morreu. O firmamento apagado nubla a pauta luminosa do que resta ao infinito, este corpo não sou eu.