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A mostrar mensagens de fevereiro, 2022

Votar no abandono

“Votar no abandono”, a mais recente crónica no Canal N . – A minha promessa eleitoral é não votar no que nos vota ao abandono. – Terminou a frase com um baque surdo no balcão do minúsculo copo onde tinha sido servido o Favaios, o que está debaixo do balcão, por detrás do Favaios com rótulo. Como em tudo na vida, quando algo nos chega sem a etiquetagem do que se pretende publicitar traz em si a originalidade do sabor autêntico do que se é. E, nas pessoas, de quem se É. Pousadas as moedas no zinco, virou costas ao dono no café que olhava as sondagens encomendadas na televisão, todas similares, nas percentagens que representam as permilagens de quem vota, e nas cores dos partidos. – Basta chamarem-se partidos, para sabermos o que aí vem. – antes de sair pela porta de alumínio baço encimada por uma torradeira de moscas que bailam reluzentes antes de caírem inanimadas no tabuleiro. Boa sorte tem a quem boa morte vem. Nas mesas escuta-se – Este é sempre do contra. Se eles ganharem, agora é q...

Carrajó

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 “Carrajó”, a mais recente crónica na secção Crónicas do Nada , no Correio do Porto. Nada como fazer variar os passos nas direcções que nem eles sabem seguir. Talvez por isso, deduzo, daí nasça a expressão “o caminho faz-se caminhando”. Há a cada restolhar da vegetação o desconhecido animal que se esconde nas sombras que os meus olhos não iluminam. É a noite, felizmente, na pardez do passeio que orla o ribeiro alcatroado onde a pressa se apressa e o claquear das tampas de saneamento parecem o esgrimir das agulhas com que a minha mãe fazia pequenas indumentárias de lã para crianças, e um dedo por cima a colocar mais fio, em troca de um trocado que tanto valia como sentimento de independência, como de migalhinhas se faz pão, acumulando ao que a vida simples nunca precisou. Desisto de caminhar pela estrada, até porque esta constante rememoração do que habita em mim e de certa forma constrói o meu passado neste hiato de tempo, está a tornar-me desleixado e a velocidade com que a pressa...
 Gosto da fluência das rugas na face, cada sulco dermático um trilho, uma vontade, um percurso percursiado e uma palavra nova, que tento reduzir ao mesmo denominador: Viver. Gosto do inaudível tique taque com que Deus brindou o Universo, um dia de cada vez, o amor nosso de cada dia nos dai hoje, porque o pão esse sairá das mãos, salgado pelo suor de quem perdoa os seus devedores. Gosto da curiosidade sadia de uma criança que me pergunta o que é o infinito. E a resposta não iniciada nem finalizada, como quem se aguarda pela intemporalidade que espreita a cada semi cerrar dos olhos quando se sonha em Viver. O amor nosso de cada dia nos dai hoje. E se não for pedir muito, amanhã também. Amen. Amem.