Nu, vem
“Nu, vem”, crónica do nada, no Correio do Porto.
É fácil perceber que, hoje, estamos em véspera de feriado num dia posterior a um Domingo, o trânsito é bem menor comparado a outros dias e as pessoas, que não passeiam na estação, deixam espaço suficiente, nem mais, nem menos, para eu transportar os meus sonhos. O calendário tem destas coisas, uns feriados estrategicamente colocados, uns dias de férias no bolso e um descanso da lufa-lufa diária na algibeira, transformando o labor num movimento menos laboral, quase como se o dia surgisse por inteiro num quotidiano a part-time.
Faltam mais de 20 minutos para o próximo comboio e vou fazendo da voz abafada, nasalada, metálica, desligada, inumana que anuncia os comboios em cada linha, a minha companhia, no final deste dia por metade.
Coloco-me estrategicamente virado para o Sol, obrigo-me a semicerrar os olhos para poder ver melhor, às 19:34 o astro-rei fita-me de frente e é das poucas vezes que um olhar faz desviar o meu. Enquanto fecho os olhos por momentos continuo a ver a minha mão e a caneta, ambos a arrastarem-se pelo bloco, uma sem a outra são nada. A caneta sem a minha mão não se ergue e a minha mão sente-se nua sem a caneta e eu, ainda alma num mecanismo biológico, sem a conjunção das duas não me ergo.
O comboio para a Régua levou as últimas vozes da gare, resto eu e as duas senhoras, idosas, do lado de lá da linha e da vida. O destino destinado não me serviu o trajecto, causou estranheza a quem me viu sentado no perfurado metal ondulado, fosse eu menos baço e tomariam a minha presença como fantasmagórica. Mas assim, sou apenas alegórica.
Antes de chegar, retrospectivando, fui brindado com uma viagem de autocarro calma. A partir de determinado momento eramos reflexos nos vidros movidos e oscilados no irregular piso, restava eu, motorista e alguns que pensam que ainda o são.
Talvez o vazio do silêncio da estação, a viagem seca e amena no autocarro, umas quantas faces sonhadoras na estrada e um banco de metal, frio, na estação, com uns abrigos desabrigados ao vento frio do final da tarde me tenham feito divagar, na realidade ficcionada, e as minhas mãos tenham agarrado canetas ilusórias que escreveram histórias que olhos não vêm.
Observo momentaneamente à direita uma nuvem, inusitadamente em forma de degrau flocado. Vou fechar o bloco, metê-lo na mochila juntamente com a caneta e deixar que outras nuvens me levem para junto de outras histórias, resquícios do futuro em memórias. Sempre assim, até ao próximo que, nu, vem.
É fácil perceber que, hoje, estamos em véspera de feriado num dia posterior a um Domingo, o trânsito é bem menor comparado a outros dias e as pessoas, que não passeiam na estação, deixam espaço suficiente, nem mais, nem menos, para eu transportar os meus sonhos. O calendário tem destas coisas, uns feriados estrategicamente colocados, uns dias de férias no bolso e um descanso da lufa-lufa diária na algibeira, transformando o labor num movimento menos laboral, quase como se o dia surgisse por inteiro num quotidiano a part-time.
Faltam mais de 20 minutos para o próximo comboio e vou fazendo da voz abafada, nasalada, metálica, desligada, inumana que anuncia os comboios em cada linha, a minha companhia, no final deste dia por metade.
Coloco-me estrategicamente virado para o Sol, obrigo-me a semicerrar os olhos para poder ver melhor, às 19:34 o astro-rei fita-me de frente e é das poucas vezes que um olhar faz desviar o meu. Enquanto fecho os olhos por momentos continuo a ver a minha mão e a caneta, ambos a arrastarem-se pelo bloco, uma sem a outra são nada. A caneta sem a minha mão não se ergue e a minha mão sente-se nua sem a caneta e eu, ainda alma num mecanismo biológico, sem a conjunção das duas não me ergo.
O comboio para a Régua levou as últimas vozes da gare, resto eu e as duas senhoras, idosas, do lado de lá da linha e da vida. O destino destinado não me serviu o trajecto, causou estranheza a quem me viu sentado no perfurado metal ondulado, fosse eu menos baço e tomariam a minha presença como fantasmagórica. Mas assim, sou apenas alegórica.
Antes de chegar, retrospectivando, fui brindado com uma viagem de autocarro calma. A partir de determinado momento eramos reflexos nos vidros movidos e oscilados no irregular piso, restava eu, motorista e alguns que pensam que ainda o são.
Talvez o vazio do silêncio da estação, a viagem seca e amena no autocarro, umas quantas faces sonhadoras na estrada e um banco de metal, frio, na estação, com uns abrigos desabrigados ao vento frio do final da tarde me tenham feito divagar, na realidade ficcionada, e as minhas mãos tenham agarrado canetas ilusórias que escreveram histórias que olhos não vêm.
Observo momentaneamente à direita uma nuvem, inusitadamente em forma de degrau flocado. Vou fechar o bloco, metê-lo na mochila juntamente com a caneta e deixar que outras nuvens me levem para junto de outras histórias, resquícios do futuro em memórias. Sempre assim, até ao próximo que, nu, vem.
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