Não saíram de mim as estrelas
Crónica de domingo, na Bird Magazine.
A campânula treme assustada pelo silêncio que se inclina sobre o vale.
Aqui, as caminhadas nocturnas são feitas por entre o nevoeiro que se liberta da terra, quente ainda, porque os dias se fazem mais corados, estendidos no esverdeado pasto.
O sino repenica pelo valado, cansado de subir encostas que só vêm eucaliptal e fogo, quando ao homem interessa tal.
As pessoas acumulam-se na multidão de pares, teremos seis ou sete casais, viúvas de gente feita, feitas de gente que jamais abraçou outra cor além do negro. O padre chegará e falará, do alto do seu catolicismo, muitas das vezes separado dos iniciais capítulos (e por isso mesmo, mais virginais) do evangelho e por entre o medo da vida e o terror da morte, cá se pecamina apenas e só por respirar.
O dia folcloriza-se, jazem ferramentas térreas, suadas de suor alheio, pelejadas de calos, caídas como sulfato aspergido ou como a estrela cadente que vi pousada num cabo eléctrico à espera que alguém a visse e se precipitasse horizonte abaixo, porque o horizonte não é onde a vista alcança, é onde os olhos descansam, a meros metros de distância, para lá do infinito ou, comummente, para cá do olhar, dentro da galáxia de células que dominam o meu olhar.
Será sempre um caminho, percorrido ou por percorrer, um abraço ou uma bolacha de um velho sortido engalanado como presente de aniversário.
Vou-me contando pelos dias, sabendo que quando os vivo transformam-se em mim mesmo, dia 12 de mim, de 2017 ou de 1935, um ano bastará para saber que contados os 365 dias e as 6 horas, não sobraram minutos ou segundos por viver, vendo paisagens e horizontes sem nunca se tocarem, como duas mãos de um mesmo corpo que nunca se juntaram, em oração, em exaltação, em carpintarização.
As mãos formam, cada uma a seu estilo, linhas disformes que afluem nos rios em que toco, sem lhes competir saber se o dono do composto químico baseado em carbono sabe, ou não, nadar.
Não saíram de mim as estrelas.
Pelo contrário.
Continuam desenhadas no interior de mim mesmo, para que as veja mesmo quando a nebulosidade de um dia cinzento ou a cinzenticidade de pessoas sem dias se sobrepõem ao facto de, para mim, o dia ser o momento em que procuro a sombra e a percorro, da cabeça aos pés, para me ver nascer da crepuscilidade ao desnivelado mirar trepidado pelo percurso altibaixado que faz vibrar cada letra que me compõe.
Há dias em que me vejo acordar ainda antes de abrir os olhos, acomodo-me a este invólucro e levanto-me como se o dia existisse mesmo, palpável, como um copo entre dedos, um corpo entre braços, para depois me ver adormecer, ainda antes de fechar os olhos, levantar-me e olhar para trás, para o milagre quântico que jaz apaziguado com o lençol e Eu continuo, de noite, ao encontro do verdadeiro Sol.
A campânula treme assustada pelo silêncio que se inclina sobre o vale.
Aqui, as caminhadas nocturnas são feitas por entre o nevoeiro que se liberta da terra, quente ainda, porque os dias se fazem mais corados, estendidos no esverdeado pasto.
O sino repenica pelo valado, cansado de subir encostas que só vêm eucaliptal e fogo, quando ao homem interessa tal.
As pessoas acumulam-se na multidão de pares, teremos seis ou sete casais, viúvas de gente feita, feitas de gente que jamais abraçou outra cor além do negro. O padre chegará e falará, do alto do seu catolicismo, muitas das vezes separado dos iniciais capítulos (e por isso mesmo, mais virginais) do evangelho e por entre o medo da vida e o terror da morte, cá se pecamina apenas e só por respirar.
O dia folcloriza-se, jazem ferramentas térreas, suadas de suor alheio, pelejadas de calos, caídas como sulfato aspergido ou como a estrela cadente que vi pousada num cabo eléctrico à espera que alguém a visse e se precipitasse horizonte abaixo, porque o horizonte não é onde a vista alcança, é onde os olhos descansam, a meros metros de distância, para lá do infinito ou, comummente, para cá do olhar, dentro da galáxia de células que dominam o meu olhar.
Será sempre um caminho, percorrido ou por percorrer, um abraço ou uma bolacha de um velho sortido engalanado como presente de aniversário.
Vou-me contando pelos dias, sabendo que quando os vivo transformam-se em mim mesmo, dia 12 de mim, de 2017 ou de 1935, um ano bastará para saber que contados os 365 dias e as 6 horas, não sobraram minutos ou segundos por viver, vendo paisagens e horizontes sem nunca se tocarem, como duas mãos de um mesmo corpo que nunca se juntaram, em oração, em exaltação, em carpintarização.
As mãos formam, cada uma a seu estilo, linhas disformes que afluem nos rios em que toco, sem lhes competir saber se o dono do composto químico baseado em carbono sabe, ou não, nadar.
Não saíram de mim as estrelas.
Pelo contrário.
Continuam desenhadas no interior de mim mesmo, para que as veja mesmo quando a nebulosidade de um dia cinzento ou a cinzenticidade de pessoas sem dias se sobrepõem ao facto de, para mim, o dia ser o momento em que procuro a sombra e a percorro, da cabeça aos pés, para me ver nascer da crepuscilidade ao desnivelado mirar trepidado pelo percurso altibaixado que faz vibrar cada letra que me compõe.
Há dias em que me vejo acordar ainda antes de abrir os olhos, acomodo-me a este invólucro e levanto-me como se o dia existisse mesmo, palpável, como um copo entre dedos, um corpo entre braços, para depois me ver adormecer, ainda antes de fechar os olhos, levantar-me e olhar para trás, para o milagre quântico que jaz apaziguado com o lençol e Eu continuo, de noite, ao encontro do verdadeiro Sol.
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