Do lado de cá da chuva
in Correio do Porto, em 14/09/2016
VOU, contente, saboreando o final de tarde por entre os pinheiros, oscilando nas sombras e calcando anos e anos de caruma que me almofadam o andar.
Já não sei se é tarde, noite, manhã ou cedo.
Sim, sei que era final de tarde, mas, para mim, tudo é final de tarde quando o céu se assemelha a um testo que dança ao sabor do vapor que sai do tacho, quando a toalha dobrada se deita para o prato, o garfo, o bocado de pão, a circunferência desenhada pelo cu da garrafa de vinho.
Não há tempo.
Para nada.
Nem para o tempo.
Pergunto, a mim e ao sobreiro resistente na esquina que sobeja, quanto resta de céu e inferno até se esfumarem, como o aroma na cozinha quase vazia, as guerras entre o que somos e o que pensamos ser, até por fim deixarmos cair, uma a uma, máscaras, como a caruma.
Não obtenho resposta, felizmente, e vou contente saboreando o final de tarde por entre os pinheiros e as pessoas, calado na imensidão de vozes que se calcam.
Escrevo-te do lado de cá da chuva, onde se aram os ares da tarde e se enraivece o vendaval, só porque sim.
Sonho também com o rugir de um mar à porta do futuro, como se me abrisse a janela a noite e viesse, devagarinho, pendendo os pés no vazio sem medo de no dia caminhar.
Ouves-me?
Aqui os rios correm quando chove, no leito vão quando se secam as nuvens, mas hoje os rios riem em todo o lado, estás a vê-los atabalhoados como petizes à saída para o recreio?
Vão a deslizar encontrando leitos por entre os paralelos, são felizes por isto, isto basta, agacham-se ao chegarem ao sulco mais profundo e imagino-os chegados pé ante pé ao peito das mães no afago sereno da maternidade depois de uma cascata de vidas.
Já pouco chove agora, cansou-se de me ler, os rios ribeirizam-se e por te ver além dali cai-me a vontade ao chão.
E a razão.
Algures paras turbilhado no cinzento que te contém. Vais vaporizar e seguir viagem, talvez triste, mas continuas.
E que será de nós?
E da chuva?
VOU, contente, saboreando o final de tarde por entre os pinheiros, oscilando nas sombras e calcando anos e anos de caruma que me almofadam o andar.
Já não sei se é tarde, noite, manhã ou cedo.
Sim, sei que era final de tarde, mas, para mim, tudo é final de tarde quando o céu se assemelha a um testo que dança ao sabor do vapor que sai do tacho, quando a toalha dobrada se deita para o prato, o garfo, o bocado de pão, a circunferência desenhada pelo cu da garrafa de vinho.
Não há tempo.
Para nada.
Nem para o tempo.
Pergunto, a mim e ao sobreiro resistente na esquina que sobeja, quanto resta de céu e inferno até se esfumarem, como o aroma na cozinha quase vazia, as guerras entre o que somos e o que pensamos ser, até por fim deixarmos cair, uma a uma, máscaras, como a caruma.
Não obtenho resposta, felizmente, e vou contente saboreando o final de tarde por entre os pinheiros e as pessoas, calado na imensidão de vozes que se calcam.
Escrevo-te do lado de cá da chuva, onde se aram os ares da tarde e se enraivece o vendaval, só porque sim.
Sonho também com o rugir de um mar à porta do futuro, como se me abrisse a janela a noite e viesse, devagarinho, pendendo os pés no vazio sem medo de no dia caminhar.
Ouves-me?
Aqui os rios correm quando chove, no leito vão quando se secam as nuvens, mas hoje os rios riem em todo o lado, estás a vê-los atabalhoados como petizes à saída para o recreio?
Vão a deslizar encontrando leitos por entre os paralelos, são felizes por isto, isto basta, agacham-se ao chegarem ao sulco mais profundo e imagino-os chegados pé ante pé ao peito das mães no afago sereno da maternidade depois de uma cascata de vidas.
Já pouco chove agora, cansou-se de me ler, os rios ribeirizam-se e por te ver além dali cai-me a vontade ao chão.
E a razão.
Algures paras turbilhado no cinzento que te contém. Vais vaporizar e seguir viagem, talvez triste, mas continuas.
E que será de nós?
E da chuva?
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