Gosto de perceber o tempo adormecido, ainda que espreguiçado, vai gotejando pelos anos sem saber que é monumento. Rosáceas forjadas por mãos retorcidas, corações que não saberão o bater de uma pedra. Acredito que ser igreja, mosteiro, memorial ou aguardente à espera de ser elevada por uma mão cheia de dedos toscos, ásperos, torcidos e cansados, seja coisa para qualquer balada que se deixa cair ao ouvido. Olvido de facto quantas rugas se perderam para que nascesse o cansaço, um abraço, ou tudo aquilo de que é feito um telhado. E pode ser, no telhado, o musgo que se deixa esverdear na tentativa do barro o convidar a ser tempo, adormecido, espreguiçado, para se fazer momento.
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A mostrar mensagens de outubro, 2012
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Fascina-me o cheiro húmido de um fogareiro que vai estalando castanhas, o olhar semicerrado do vendedor, cigarro ao canto da boca, chapéu gasto de histórias por contar, o fumo que se acumula sob a tenda improvisada. Ou o passear improvisado ao final da tarde, por vegetação rasteira que se sabe pequena e não quer crescer, ladeado pelo Sol que se esconde e a Lua que ascende, o céu laranja a fugir de tom até um azul escuro. Nunca pensei que todo um dia coubesse numa fracção de segundo. Ou, ainda, uma carrinha velha, de caixa aberta, carregada de lenha, batatas, castanhas e verduras, coisas que a terra dá, conduzida por um homem, Homem, velho, gasto, que sorri quando o ultrapasso e olho para ver quem tão devagar conduz. E eu, que perco a vontade de lutar ao ver, desnuda, a simplicidade. A trindade. Santíssima.
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Andas de poesia, enquanto outros caminham pela chuva, sem se lembrarem da placidez que a memória, adormecida pelo tempo, traz de cada vez que este globo se acerca da órbita de um só homem. A vida foi-se, perdida, pelas promessas revolucionárias ou, simplesmente, pelas revoluções prometidas. Subjugam-se eternamente, na crença que um estado, um governo, um grupo de pessoas reunidas em torno de algo, possam trazer a segurança, a realização e a felicidade. Mais seguro, real e feliz é (tentar, sempre) perceber o porquê do porquê, no escuro, na luz, na sombra ou no despertar do dia, que ser-se apenas o que É é o suficiente, por muito que te espreitem a etiqueta, a extensão do currículo, o veículo ou o falar, que te arremessem a exactidão científica, a prova cega e cabal, o juro e a acção, não a boa, a bancária, sem ser ou não ser, pelo medo e pela fé. Andas de poesia. Não, não andas, voas.