Cloud(icando)

O frio vai surgindo, deixa-se cair como um lençol invisível pelas costas... Arrepio-me... Por momentos penso que é já de manhã, sacudindo o sono debaixo da chuveirada fria (haverá melhor forma de começar o dia?)... 
Os dias têm adormecido cansados, pudera, vou deixando-os ao abandono, desterrados, para me entreter sentado no topo de um qualquer monte (hoje, Gerês), fechando as mãos e soprando para elas, para depois as abrir e moldar umas quantas nuvens. Fazem-me cócegas nas palmas das mãos, rodopiam por momentos, com os olhitos entreabertos a mirarem-me sem saberem muito bem o que fazer. Acrescento-lhes um pouco de azul que deixo cair dos olhos, moldo-as um pouco mais, ergo as mãos para um ponto cardeal a gosto (ultimamente tenho-me virado a Norte) e sopro as nuvens, que vão subindo e crescendo rapidamente, sorrindo quando o vento as leva para lá de onde eu consigo alcançar, aumentando quando alguns cristais de aglomeram para as verem passar e, desprevenidos, se deixam apanhar neste algodão doce gigante. 
Quantas nuvens terei eu já feito? 
E para quê? 
Mas, confesso ainda sem saber, vou fazendo-as, todos os dias, de diferentes tamanhos, sem qualquer molde, que fazedor de nuvens há-de ser criativo o suficiente para deixar que as nuvens moldem a mão, para que um dia elas, estejam lá onde estiverem, se lembrem de mim e me venham rodear quando estiver sentado algures, moldarem-me para que eu, de olhos entreabertos, confuso, acorde de novo, num outro monte, num outro ermo, moldado a nuvens, vento, sonhos e olhares.

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