Sol
O Sol entra-me, literalmente, pela janela da sala.
Gosto disto, do simples facto de ele me acompanhar e parar quando o faço, de me espreitar por uma nesga, por vezes duas, vendo-me escrever.
Ainda que preguiçoso, levanto algumas vezes o caderno e lanço umas letras ao desafio. Noutra ocasião, coitado, abro o caderno e escrevo apenas no ar, sem tocar o papel, apenas para não o ter, depois, amuado pelo simples facto de, pasme-se, não o escrever!
Há um tudo, nesta minha sucessão de nadas com que me visto, que me faz profundamente feliz.
Este silêncio de hora de almoço na aldeia, o copo a fumegar em cima da mesa, o pequeno bloco que se aconchega na perna, cruzada, o Sol que se encosta ao meu ombro e esta sonolência que se vai apoderando de mim até que, por fim, se instala e abre a porta para todos estes e estas que me rodeiam, que me sussurram e me sopram na face, saudando-me, falando-me, trazendo-me um pouco das paisagens que, imagino, já pisaste, correndo de um lado para o outro, com as mãos levantadas tocando o céu, os céus.
Sei que por momentos adormeço, para acordar um minuto depois com o sabor de uma vida vivida, à minha maneira, entre tique-taques assíncronos, vestido de nada com o Sol a descansar no meu ombro.
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