Não sei porquê

Perdi alguns minutos a pensar num título.
Não consegui encontrar nada, muito por culpa de não saber o que escrever depois do título.

Até onde poderá ir o questionamento? Em todos os cantos do meu ser, físico, há desejo de partir, de viver mais do que aquilo que a vida permite. Continuo a ser mais do que posso, a sonhar mais do que durmo, continuo a ser astronauta num dia e poeta noutro, para depois ser o Miguel, perdido no meio de computadores... Até quando a vida em pequenas rimas?
"Um dia também irás crescer", foi-me dito mais do que uma vez, tal como os sorrisos nervosos de quem não vê os meus sonhos... Ou o riso, meu, quando ouço o que sou, quando olho ao espelho.
Somos ensinados para crescermos e sermos alguém... Não nos incutem a palavra sonho, apenas crescer e ser alguém. Não falam em procurar o talento, em descobrir aquilo que as nossas mãos fazem quando estamos de olhos fechados. Não. Temos que ser alguém o que invariavelmente, para algumas matilhas, significa ter projecção social, ou seja: ou estuda, ou ganha dinheiro, ou vira celebridade (não importa como)... Entristece-me a falta de motivação para as pessoas serem quem são... E o que mais me entristece é não saber porque razão isto me entristece.
Ouço um pouco das falas do documentário "Ainda há Pastores?" e tento perceber, mesmo sem olhar, o fascínio que exerce em mim... Recordo-me de hoje à tarde, em casa dos meus pais, ao ver a Farrusca deitada no chão, a vontade de me deitar sobre a erva, terra e pedras e os condicionalismos vários que adquirimos quando "crescemos" e que nos fazem a não fazer aquilo que desejaríamos...
Concedo-me a este exercício. Olhar para mim. O que faço. O que sou? Sou quem quero ser? Ou apenas quem devo ser? E é aqui, neste momento, por vezes taciturno, que rio e choro, que me olho e me escondo, onde concedo à vida desfolhar algumas frases... Ainda não tenho título, mas possuo vários prólogos no final de cada palavra.

Que faço com as ideias?

Tenho várias histórias, estórias, poemas e contos. Tenho ilustrações e agradecimentos finais de livros que ainda não escrevi. E a vida, a vida não me deixa sentar no mesmo local duas vezes, leva-me para onde quer, quando quer, deixando-me com a dilaceração dos relógios e das pessoas, das nuvens e enseadas que moram em mim e me murmuram o barulho do mar.
Chega a doer escrever, não sei porquê (eis o título), talvez sejam as histórias e as paisagens e a minha ânsia de ser personagem ou ver moinhos de vento em todas as encostas.
Gostava de ser vento, de estar em todos os locais ao mesmo tempo, mas enquanto não sou perco-me nas identidades do que escrevo, nos ramos despidos de pessoas nuas que passam pelas minhas folhas enquanto escrevo...

Enquanto escrevo sinto que não sou mais do que um poema escrito por mim próprio, além, onde ainda não cheguei e os meus dias são linhas, linhas que não rimam, linhas que saltam de página em página, até que o livro me morra e eu nasça... Não sei porquê.

Comentários

Juℓi Ribeiro disse…
Miguel:

Somos parte de nossos poemas,
vivemos e sonhamos em cada linha que escrevemos.
Somos artesãos de nossos sentimentos e palavras
e mesmo que em alguns momentos
venha a nossa mente a frase:
"Não sei porquê..."
Os nossos sentimentos continuam
a fluir de uma fonte serena
que desagua em nossos corações.
É como se doesse não podermos expressar em palavras
o que sentimos.
MAS VOCÊ HABILMENTE COLOCA EM PALAVRAS SENSAÇÕES E SENTIMENTOS.
Existem momentos que sentimos dificuldade mas o maior poeta é o nosso criador e somos uma poesia que ele escreveu no soneto da eternidade.

AQUI VOCÊ DIZ:
"Gostava de ser vento, de estar em todos os locais ao mesmo tempo, mas enquanto não sou perco-me nas identidades do que escrevo, nos ramos despidos de pessoas nuas que passam pelas minhas folhas enquanto escrevo..."

EU DIGO:
Você é o vento, está em todos os locais ao mesmo tempo, ramos despidos, pessoas nuas, folhas
e todo o enorme sentimento
que desabrocha nas palavras que escreves...

Perdoe o meu longo comentário.
Desejo a você, sua família
e amigos uma semana
de paz e alegria.
Beijo.
José Lopes disse…
Há quem procure o sucesso, há quem nos incuta muita ambição, há quem despreze a realidade, a normalidade e a beleza que muitos encontram no que nos rodeia, sem que isso tenha que ver directamente com lucro ou sucesso. A ganância muitas vezes faz-nos desperdiçar o prazer de viver.
Cumps
Maggie disse…
Obrigado pela visita. De facto, adoro esse documentário. Estou à espera da Rosa Brava e tantos outros!
Beijinho e volta sempre para conversarmos mais um pouco! ;)
Anónimo disse…
é importante fazermos estas reflexões, miguel. gostei de ler :)
Sofia disse…
Miguel

Mas tu sentes que para "crescer e ser alguém", é preciso sonhar...

Talvez as pessoas não o digam porque essa é a parte que temos de ser nós próprios a descobrir...

Bjs
BlueShell disse…
Grata pela tuas visita e pelas tuas palavras. Hoje, mais do que nunca, preciso mesmo.
Beijinhos de BlueShell
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