De profundis
Ia deitar-me, mas esta vontade ou necessidade de escrever algo chamou-me aqui, ao computador...
Quando eu pensava que não se podia descer mais baixo, eis que a espiral descendente dá meia dúzia de tropeções e estende-se ao comprido...
Andei um pouco a pé (está frio como o chêbas) e isso permitiu-me colocar algumas ideias no sítio... Acho que a noite tem um efeito em mim como a água das pedras, as bolhinhas vão subindo até chegarem ao topo e rebentaram. Isso acontece-me, nomeadamente com várias ideias e pensamentos... Confesso que tenho uma má digestão para o que de (muito) mau se vê por esse mundo fora, o que faz com que tenha que sair, olhar a Lua e digerir da melhor forma... As reacções são, por vezes, díspares; o resultado podem ser umas lágrimas, umas sonoras gargalhadas ou uns tímidos sorrisos, um arroto bem português e ficamos por aqui ;)
O barómetro da sociedade tem como fundamentos alguns pressupostos que me deixam se não perplexo, pelo menos atónito (ora aqui está um ex-libris deste blog). Uma pessoa é pessoa se tem prefixo. Se não tem, deve então ter uma profissão de algum destaque (nada de trolha, carpinteiro, florista ou canalizador) e, preferencialmente, bem remunerada, se assim não for, então o melhor será encontrar algo que camufle bem o interior e permita exibir sinais exteriores de "bom viver" (roupa de marca, calçado de marca, óculos de marca, malas e acessórios de marca, cinto de marca, relógio de marca, tudo obviamente misturado com os tons/tendências da moda - isto explica o porquê de andarem todos vestidos de igual, com o mesmo penteado, com os mesmos vernáculos e a ouvirem as mesmas músicas). A pessoa pode associar as duas coisas: ter um prefixo (religioso, profissional, monárquico, etc.) e ganhar muito bem e aí é imbatível, excepto quando surge alguém com uma formação superior ainda superior a ganhar muito, mas mesmo muito dinheiro... Por isso convém ter um plano B, isto é, ter algo que mais ninguém tenha ou que seja de muito difícil aquisição, tipo uma viagem à quinta gruta a contar do 5º meridiano para a direita de Greenwich que nunca tenha sido anunciado em lado algum, ou tocar um instrumento celta em forma fálica (isto afasta muita gente)...
Levo isto na brincadeira, felizmente encontro pessoas tão boas, tão grandes enquanto "gente" que me fazem ganhar esperança que um dia as "coisas" mudem...
Existe também uma certa tendência para exagerar nas reacções, dos mais pessimistas-extremistas (isto está cada vez pior) aos mais optimistas-maioneseiros (é só amor, só amor)... Nada de mal contra as posições de cada um, aliás, defendo diferentes posições desde que li/vi o Kamasutra... No entanto, encontro as pessoas tão rígidas (agressivamente ou passivamente) que me faz uma certa confusão e me leva a desiludir quanto a um rumo diferente para nós enquanto espécie...
Por vezes imagino que tudo isto é um sonho... Que estou a sonhar... E isso reconforta-me, imagino que daqui a pouco acordo, sento-me na cama, tremo um pouco de frio, levanto-me e vou à casa-de-banho, abro a torneira da água fria e com as mãos em concha ergo água à cara, lavando-a e, depois, olho para o espelho, sorrio e digo para mim mesmo: que sonho estranho! E saio por aí fora contando aos meus amigos que tive um sonho surrealíssimo, onde estava num planeta com uma humanidade irreal, um planeta onde a meros metros poderia estar alguém a morrer à fome que ninguém fazia nada, onde se matava com a mesma facilidade com que se estala um dedo... Brrr... Um arrepio na espinha e o desejo de jamais ter aquele sonho acordam-me ainda mais...
Mas não é um sonho...
Aflige-me a falta de um plano a nível global para a humanidade enquanto espécie, não só pelo facto de ser humano, mas pelo facto de não termos nada contra nós neste berlinde azul, não termos para onde ir e continuarmos com agressões bárbaras aos nossos semelhantes, sejam físicas, intelectuais, emocionais... Talvez eu esteja errado. Eventualmente todos os seres humanos acreditarão numa vida depois da morte e, então, caminhem a passos largos para se autodestruirem e, assim, entrarem no reino dos céus ou algo que o valha...
O facto de não existir o mínimo interesse de quem nos governa num plano mais global não me surpreende, mas fico estarrecido de medo com o facto de não existirem amostras microscópicas de as pessoas/gente/maralha desejarem um futuro diferente, um mundo mais equilibrado, justo, habitável e respirável... Olho pela janela, a Lua já saiu do meu horizonte e ao longe vejo algumas luzes dos postes de iluminação da estrada que vai para Paredes. Penso que aquela estrada, que dá ligação a minha casa, também dá ligação para outras casas/barracos/brejos/lugarejos/céus estrelados onde se morre por fome... Fome!!! E enquanto comemos, à mesa, e vemos o telejornal, mastigamos gulosamente um qualquer naco de uma carne transgénica ou com uma gripe qualquer e nem reparamos nos olhos fundos e nos braços esqueléticos de uma criança com 2 minutos de esperança de vida. E se reparamos, é para mudar de canal imediatamente, porque a visão das moscas tira-nos o apetite...
Tenho nojo, confesso... Tenho um asco visceral pela ausência nos nossos corações de uma fraternidade salutar, ao contrário da solidariedade bacoca patrocinada pelos canais de televisão (ok, antes ínfimo que nada, mas querem tapar-me os olhos? Onde estariam os actos de solidariedade se as câmaras de televisão não estivessem presentes?)... Para onde caminhamos? "Não é meu problema..."; "E o que podemos nós fazer?"; "Isso é muito bonito, mas ninguém faz nada!"...
Ok, já compreendi porque razão tinha que vir escrever... Havia que libertar isto antes de me deitar, senão corro o risco de amanhã acordar com fungos na pele, tanta é a escumalha de pensamentos podres que trago comigo... Seremos nós, humanidade, como um pomar onde já não há frutos sadios, somos apenas um frutos podres?
Lembro-me de Ghandi dizer para sermos a mudança que desejamos ver no mundo... Ok, concordo... Mas, com todo o respeito, honrando e homenageando o seu triunfo, o que lhe aconteceu? Um fanático matou-o... E o resultado? Ok, a Índia ficou "independente", mas e agora? Armas nucleares, conflitos religiosos (puf, e isto nunca mais acaba), fome, miséria, maus pilotos de Fórmula 1 e vendedores de flores (com este humor, nunca hei-de ser levado a sério)...
Agora a sério... De tantas e tantas personagens com ideias fantásticas, uns mais conhecidos que outros, que passaram por este planeta, durante séculos, qual o saldo? Somos melhores? Os passos que damos são mais ponderados? Existe uma melhoria global? E a tendência é melhorar?
Seremos nós, enquanto humanidade, um solo infértil onde nem as sementes espalhadas por "grandes personagens" conseguem germinar?
Quando eu pensava que não se podia descer mais baixo, eis que a espiral descendente dá meia dúzia de tropeções e estende-se ao comprido...
Andei um pouco a pé (está frio como o chêbas) e isso permitiu-me colocar algumas ideias no sítio... Acho que a noite tem um efeito em mim como a água das pedras, as bolhinhas vão subindo até chegarem ao topo e rebentaram. Isso acontece-me, nomeadamente com várias ideias e pensamentos... Confesso que tenho uma má digestão para o que de (muito) mau se vê por esse mundo fora, o que faz com que tenha que sair, olhar a Lua e digerir da melhor forma... As reacções são, por vezes, díspares; o resultado podem ser umas lágrimas, umas sonoras gargalhadas ou uns tímidos sorrisos, um arroto bem português e ficamos por aqui ;)
O barómetro da sociedade tem como fundamentos alguns pressupostos que me deixam se não perplexo, pelo menos atónito (ora aqui está um ex-libris deste blog). Uma pessoa é pessoa se tem prefixo. Se não tem, deve então ter uma profissão de algum destaque (nada de trolha, carpinteiro, florista ou canalizador) e, preferencialmente, bem remunerada, se assim não for, então o melhor será encontrar algo que camufle bem o interior e permita exibir sinais exteriores de "bom viver" (roupa de marca, calçado de marca, óculos de marca, malas e acessórios de marca, cinto de marca, relógio de marca, tudo obviamente misturado com os tons/tendências da moda - isto explica o porquê de andarem todos vestidos de igual, com o mesmo penteado, com os mesmos vernáculos e a ouvirem as mesmas músicas). A pessoa pode associar as duas coisas: ter um prefixo (religioso, profissional, monárquico, etc.) e ganhar muito bem e aí é imbatível, excepto quando surge alguém com uma formação superior ainda superior a ganhar muito, mas mesmo muito dinheiro... Por isso convém ter um plano B, isto é, ter algo que mais ninguém tenha ou que seja de muito difícil aquisição, tipo uma viagem à quinta gruta a contar do 5º meridiano para a direita de Greenwich que nunca tenha sido anunciado em lado algum, ou tocar um instrumento celta em forma fálica (isto afasta muita gente)...
Levo isto na brincadeira, felizmente encontro pessoas tão boas, tão grandes enquanto "gente" que me fazem ganhar esperança que um dia as "coisas" mudem...
Existe também uma certa tendência para exagerar nas reacções, dos mais pessimistas-extremistas (isto está cada vez pior) aos mais optimistas-maioneseiros (é só amor, só amor)... Nada de mal contra as posições de cada um, aliás, defendo diferentes posições desde que li/vi o Kamasutra... No entanto, encontro as pessoas tão rígidas (agressivamente ou passivamente) que me faz uma certa confusão e me leva a desiludir quanto a um rumo diferente para nós enquanto espécie...
Por vezes imagino que tudo isto é um sonho... Que estou a sonhar... E isso reconforta-me, imagino que daqui a pouco acordo, sento-me na cama, tremo um pouco de frio, levanto-me e vou à casa-de-banho, abro a torneira da água fria e com as mãos em concha ergo água à cara, lavando-a e, depois, olho para o espelho, sorrio e digo para mim mesmo: que sonho estranho! E saio por aí fora contando aos meus amigos que tive um sonho surrealíssimo, onde estava num planeta com uma humanidade irreal, um planeta onde a meros metros poderia estar alguém a morrer à fome que ninguém fazia nada, onde se matava com a mesma facilidade com que se estala um dedo... Brrr... Um arrepio na espinha e o desejo de jamais ter aquele sonho acordam-me ainda mais...
Mas não é um sonho...
Aflige-me a falta de um plano a nível global para a humanidade enquanto espécie, não só pelo facto de ser humano, mas pelo facto de não termos nada contra nós neste berlinde azul, não termos para onde ir e continuarmos com agressões bárbaras aos nossos semelhantes, sejam físicas, intelectuais, emocionais... Talvez eu esteja errado. Eventualmente todos os seres humanos acreditarão numa vida depois da morte e, então, caminhem a passos largos para se autodestruirem e, assim, entrarem no reino dos céus ou algo que o valha...
O facto de não existir o mínimo interesse de quem nos governa num plano mais global não me surpreende, mas fico estarrecido de medo com o facto de não existirem amostras microscópicas de as pessoas/gente/maralha desejarem um futuro diferente, um mundo mais equilibrado, justo, habitável e respirável... Olho pela janela, a Lua já saiu do meu horizonte e ao longe vejo algumas luzes dos postes de iluminação da estrada que vai para Paredes. Penso que aquela estrada, que dá ligação a minha casa, também dá ligação para outras casas/barracos/brejos/lugarejos/céus estrelados onde se morre por fome... Fome!!! E enquanto comemos, à mesa, e vemos o telejornal, mastigamos gulosamente um qualquer naco de uma carne transgénica ou com uma gripe qualquer e nem reparamos nos olhos fundos e nos braços esqueléticos de uma criança com 2 minutos de esperança de vida. E se reparamos, é para mudar de canal imediatamente, porque a visão das moscas tira-nos o apetite...
Tenho nojo, confesso... Tenho um asco visceral pela ausência nos nossos corações de uma fraternidade salutar, ao contrário da solidariedade bacoca patrocinada pelos canais de televisão (ok, antes ínfimo que nada, mas querem tapar-me os olhos? Onde estariam os actos de solidariedade se as câmaras de televisão não estivessem presentes?)... Para onde caminhamos? "Não é meu problema..."; "E o que podemos nós fazer?"; "Isso é muito bonito, mas ninguém faz nada!"...
Ok, já compreendi porque razão tinha que vir escrever... Havia que libertar isto antes de me deitar, senão corro o risco de amanhã acordar com fungos na pele, tanta é a escumalha de pensamentos podres que trago comigo... Seremos nós, humanidade, como um pomar onde já não há frutos sadios, somos apenas um frutos podres?
Lembro-me de Ghandi dizer para sermos a mudança que desejamos ver no mundo... Ok, concordo... Mas, com todo o respeito, honrando e homenageando o seu triunfo, o que lhe aconteceu? Um fanático matou-o... E o resultado? Ok, a Índia ficou "independente", mas e agora? Armas nucleares, conflitos religiosos (puf, e isto nunca mais acaba), fome, miséria, maus pilotos de Fórmula 1 e vendedores de flores (com este humor, nunca hei-de ser levado a sério)...
Agora a sério... De tantas e tantas personagens com ideias fantásticas, uns mais conhecidos que outros, que passaram por este planeta, durante séculos, qual o saldo? Somos melhores? Os passos que damos são mais ponderados? Existe uma melhoria global? E a tendência é melhorar?
Seremos nós, enquanto humanidade, um solo infértil onde nem as sementes espalhadas por "grandes personagens" conseguem germinar?
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Mas não há-de ser nada ....