Casta de solidão fugidia
Os meus posts podem, eventualmente os últimos, levar alguém a pensar que perdi a esperança no mundo e nas pessoas... Nada disso... Apenas olho, cansado, e admito, talvez pela primeira vez, que afinal o caminho não é tão plano ou isento de obstáculos, mas sim tortuoso que, penso, apenas uma "empreitada" diferente poderia modificar... Mas isso são outras histórias...
A agressividade com que as pessoas defendem os seus pontos de vista, leva-me a pensar que, de facto, talvez estejam a defender a segurança que sentem à sombra de determinado ideal e não o ideal em si... Mas isto, também, pertence a outro stock de histórias...
Hoje dei por mim a ver o telejornal, e eis que surge a notícias que todos aguardam... Vêm aí os incêndios, sim, os incêndios! A nova brigada da GNR está a postos, os bombeiros (o sindicato, porque os bombeiros propriamente ditos, esses "só" andam lá "vida por vida") não gostam, uns dizem que vai ser melhor o combate, outros que será pior... Bem, creio que poderão aferir em breve se de facto assim será, pois passei por três incêndios em 20 quilómetros... Coitadito de mim, andei para aí a pensar que não existia nada mais para arder, mas afinal estava errado... Sim, arde e arde bem! E lá vou eu, lacrimejando por causa do fundo e da tristeza arrebatadora que sinto ao ver arder as árvores, os ninhos, os bichos... Mas pouco importa as pessoas que perdem terra, os animais que perdem a vida, interessa sim saber quem ganha, ou seja, quem tem razão? A energumeneidade...
E nem de propósito, estou a ouvir "Asa branca" cantada pela Isabel Silvestre (CD "A Portuguesa")...
Tenho a meu lado um recorte de um jornal ("JN" de Domingo) sobre um pastor... Li e reli, com enorme prazer... E tornei a ler :)
E lembrei-me de um episódio, há alguns anos, ao ver uma vindima. Uma senhora idosa correu a apanhar as uvas e o vinho que tinha caído de uma cesta de vindima, que se virou... Foi vulgar, eu sei, mas naquele gesto estava um carinho e um desespero sem par... O esforço que se faz para extrair da terra o pão, o sustento... O carinho de fazer crescer com as mãos...
Não sei porque raio escrevi isto... Serviria de mote para escrever um poema e, lá, inserir todas as emoções que quero, mas não o faço...
A minha cabeça dava uma novela... Puxo o cordão e logo vem um novelo... Sai um episódio e entra outro... Era mais novo, cerca de 16 anos... Fui com o meu pai a uma quinta antiga, com uns portões enormes de madeira (podre), com adega, estábulos e uma casa pequena... Creio que o resto da quinta já tinha caído. Morava lá uma senhora com 80 anos, velha, de idade e aparência. O meu pai foi contratado pelos filhos, dois, um médico e outro não sei o que faria... A senhora, enquanto o meu pai preparava uma fechadura no pequeno cubículo que era o quarto dela, contou que os filhos levaram-na para um apartamento, no Porto, mas que ela disse-lhes que se atiraria da varanda (5º andar) se eles não a levassem para casa... E assim eles a trouxeram, para aquele quarto, com uma cama que ela partilha com as galinhas e as canecas de metal que enche com um café mais preto que a noite escura e com muita borra... O cheiro não era dos mais agradáveis, mas havia algo naquele local que me emocionava bastante... E ainda o faz quando o meu pensamento visita aquele local... Basta fechar os olhos para ir lá e recordar os degraus, os portões velhos (apesar de os termos posto novos), a adega, as galinhas em cima da cama... Sorrio ainda ao recordar-me da senhora a subir a custo so degraus, a levantar e pousar o fervedor com o café, a falar com as galinhas... E dou por mim a querer fazer algo pelas pessoas assim... Quando na verdade, a "única" coisa que podemos fazer por alguém é sermos nós mesmos... E quando somos nós mesmos somos amor.
E para finalizar, lembro apenas dois episódios (para terminar a telenovela) quando o meu pai falou, meio a brincar, que estava velho (deveria ter na altura uns 40 e qualquer coisas anos) e ela disse: "oh jovem, você à minha beira é um bebé" e foi assim que ela disse que tinha 80 anos (mais qualquer coisa, mas não recordo com precisão). Depois, sob o calor, a senhora ofereceu-nos vinho, eu não bebo, mas o meu pai aceitou e ela, com as suas mãos muito enrugadas, foi ao barril, pegou numa caneca de metal que estava em cima do pipo e, com a outra mão, abriu a torneira de madeira e o vinho caiu na caneca, fazendo espuma... Ela ofereceu a caneca ao meu pai e disse: "se calhar tem nojo de uma velha como eu, mas só tenho esta caneca", o meu pai sorriu e apenas disse "por amor de deus", pegando na caneca e bebendo o vinho. Quando pousou a caneca vi que tinha sobrado um pouquito de vinho. Esperei que eles saíssem e, decidido, fui provar o vinho, para matar a sede, mas também para ver a que sabia (era novo... nada de álcool, ok?)... E sabia a algo estranho... Vindo das mãos daquela senhora, velha, daquele ser humano com uma placidez no olhar fantástica... Degustei o melhor que sabia, mas percebi desde logo, aquilo era vinho diferente... Deveria ser de uma casta nova... E quando vi a senhora, fora da adega, a ver o meu pai trabalhar e a sorrir, percebi que aquele vinho era vida, era de uma casta de solidão fugidia.
A agressividade com que as pessoas defendem os seus pontos de vista, leva-me a pensar que, de facto, talvez estejam a defender a segurança que sentem à sombra de determinado ideal e não o ideal em si... Mas isto, também, pertence a outro stock de histórias...
Hoje dei por mim a ver o telejornal, e eis que surge a notícias que todos aguardam... Vêm aí os incêndios, sim, os incêndios! A nova brigada da GNR está a postos, os bombeiros (o sindicato, porque os bombeiros propriamente ditos, esses "só" andam lá "vida por vida") não gostam, uns dizem que vai ser melhor o combate, outros que será pior... Bem, creio que poderão aferir em breve se de facto assim será, pois passei por três incêndios em 20 quilómetros... Coitadito de mim, andei para aí a pensar que não existia nada mais para arder, mas afinal estava errado... Sim, arde e arde bem! E lá vou eu, lacrimejando por causa do fundo e da tristeza arrebatadora que sinto ao ver arder as árvores, os ninhos, os bichos... Mas pouco importa as pessoas que perdem terra, os animais que perdem a vida, interessa sim saber quem ganha, ou seja, quem tem razão? A energumeneidade...
E nem de propósito, estou a ouvir "Asa branca" cantada pela Isabel Silvestre (CD "A Portuguesa")...
Tenho a meu lado um recorte de um jornal ("JN" de Domingo) sobre um pastor... Li e reli, com enorme prazer... E tornei a ler :)
E lembrei-me de um episódio, há alguns anos, ao ver uma vindima. Uma senhora idosa correu a apanhar as uvas e o vinho que tinha caído de uma cesta de vindima, que se virou... Foi vulgar, eu sei, mas naquele gesto estava um carinho e um desespero sem par... O esforço que se faz para extrair da terra o pão, o sustento... O carinho de fazer crescer com as mãos...
Não sei porque raio escrevi isto... Serviria de mote para escrever um poema e, lá, inserir todas as emoções que quero, mas não o faço...
A minha cabeça dava uma novela... Puxo o cordão e logo vem um novelo... Sai um episódio e entra outro... Era mais novo, cerca de 16 anos... Fui com o meu pai a uma quinta antiga, com uns portões enormes de madeira (podre), com adega, estábulos e uma casa pequena... Creio que o resto da quinta já tinha caído. Morava lá uma senhora com 80 anos, velha, de idade e aparência. O meu pai foi contratado pelos filhos, dois, um médico e outro não sei o que faria... A senhora, enquanto o meu pai preparava uma fechadura no pequeno cubículo que era o quarto dela, contou que os filhos levaram-na para um apartamento, no Porto, mas que ela disse-lhes que se atiraria da varanda (5º andar) se eles não a levassem para casa... E assim eles a trouxeram, para aquele quarto, com uma cama que ela partilha com as galinhas e as canecas de metal que enche com um café mais preto que a noite escura e com muita borra... O cheiro não era dos mais agradáveis, mas havia algo naquele local que me emocionava bastante... E ainda o faz quando o meu pensamento visita aquele local... Basta fechar os olhos para ir lá e recordar os degraus, os portões velhos (apesar de os termos posto novos), a adega, as galinhas em cima da cama... Sorrio ainda ao recordar-me da senhora a subir a custo so degraus, a levantar e pousar o fervedor com o café, a falar com as galinhas... E dou por mim a querer fazer algo pelas pessoas assim... Quando na verdade, a "única" coisa que podemos fazer por alguém é sermos nós mesmos... E quando somos nós mesmos somos amor.
E para finalizar, lembro apenas dois episódios (para terminar a telenovela) quando o meu pai falou, meio a brincar, que estava velho (deveria ter na altura uns 40 e qualquer coisas anos) e ela disse: "oh jovem, você à minha beira é um bebé" e foi assim que ela disse que tinha 80 anos (mais qualquer coisa, mas não recordo com precisão). Depois, sob o calor, a senhora ofereceu-nos vinho, eu não bebo, mas o meu pai aceitou e ela, com as suas mãos muito enrugadas, foi ao barril, pegou numa caneca de metal que estava em cima do pipo e, com a outra mão, abriu a torneira de madeira e o vinho caiu na caneca, fazendo espuma... Ela ofereceu a caneca ao meu pai e disse: "se calhar tem nojo de uma velha como eu, mas só tenho esta caneca", o meu pai sorriu e apenas disse "por amor de deus", pegando na caneca e bebendo o vinho. Quando pousou a caneca vi que tinha sobrado um pouquito de vinho. Esperei que eles saíssem e, decidido, fui provar o vinho, para matar a sede, mas também para ver a que sabia (era novo... nada de álcool, ok?)... E sabia a algo estranho... Vindo das mãos daquela senhora, velha, daquele ser humano com uma placidez no olhar fantástica... Degustei o melhor que sabia, mas percebi desde logo, aquilo era vinho diferente... Deveria ser de uma casta nova... E quando vi a senhora, fora da adega, a ver o meu pai trabalhar e a sorrir, percebi que aquele vinho era vida, era de uma casta de solidão fugidia.
Comentários
Beijos.
:)
A cada olhar teu no mundo pode existir vida e mudança. Não é muito, mas é apenas o algo (nada, apenas palavras) que te posso dizer.
:)