O tempo ameaça arrefecer e eu agradeço. Tenho comigo Garrincha, que sai à rua quando neva, de tão impaciente, ainda que pacato, transforma-me os dias em granizo, saraiva-me a sua vontade de vaguear por montes, um esmolegrino que pernoita em qualquer recanto, desde que quente, desde que local porque, disse-me ele, há poisos imensos que são nenhures e, confessa-me, o seu verdadeiro poiso (soube-o Torga quando o conheceu em vésperas de Natal) era debaixo do seu casaco, entre a pele e a Lua.
Guardo o olhar que choveste, deixo as nuvens florirem nos pastos faustos do destino, tacteio mãos e escuridões em busca de um dorso com outras mãos. Curvam-se as curvas da estrada e as margens que me separam da madrugada. Empobrece-me o nada à sombra e resguardo da minha alçada, no noctívago sentimento de aguardar, à candeia ténue da Lua, o suspiro inaudível da vida no meu peito a ancorar...
Comentários