Arraia lar

Ainda que me morda, a vida vai despertando-me para as memórias vividas agora, no presente.
Percorro novos caminhos, mas o granito parece ser o mesmo que sucumbe primeiro e, depois, altivamente, nos suga aos confins dele mesmo, para sabermos o que é ser estrada, a direcção sem sentido, o fazer parte do percurso sem nunca ter caminhado.
O arraial arrailado está, as velas vão iluminando sem o mesmo vigor, agora que a enxurrada de orações passou e ecoa apenas nos olhares que se lançam às vestes alheias ou nos vultos que se vestem de espuma no fundo do copo.
A banda bandaliza o que pode, de música apenas o baixo, grave, que me acerta como se alguém batesse ao corpo com pressa de entrar.
A música musicada está, ameaçando com os seus espectáculos espectrantes romper o que sobra do tempo que ainda se cola à igreja.
A igreja igrejada está, teima em tentar perceber, não eu, que desisti, a característica desumanidade de humanizar a religião construindo muros em torno de altares, destruindo liberdades em torno de olhares, sem saber, a humanidade, não a igreja, que o altar mais sagrado é aquele que somos, cada um de nós, mais ou menos granitizado, mais ou menos marmorizado, dentro e fora, para dentro e para fora, do que existimos e fazemos existir, para sermos nada mais nada menos que um mero e fulcral paralelo no caminho de alguém, uma estrada sem direcção, um altar que, sem o saber, venera as fachadas que quem não se sabe luz faz erguer.
Ergue-te, altar, tu, que te esperam já as estrelas para te verem sorrir, sonhar...

Comentários

Zé Povinho disse…
Tenho andado um pouco afastado, mas esta é uma boa ocasião para felicitar o autor deste texto.
Abraço do Zé

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